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  • Foto do escritorLuiza Azevedo

Da colonização ao imperialismo: quem tem direito a indenizações?

Atualizado: 11 de ago. de 2023

A relação entre economia e poder é indissociável e não é de hoje que a hierarquia internacional dita as regras do jogo em seu favor. A discussão sobre a dívida histórica do Sul Global e as demandas pelo cancelamento da mesma dão a tônica do debate. Tendo em vista esse cenário, é interessante recorrermos a história de dominação do Norte sobre o Sul. As indenizações devidas e as de fato pagas nos processos de Colonização e Imperialismo nos apontam como se dá esse movimento. Quem cobra as indenizações? Quem as paga? As respostas não são surpreendentes.


Colonização, independência e as indenizações pagas


Navio Negreiro de Rugendas.

Como brasileiras e brasileiros temos proximidade com o que significa ter sido uma colônia. Sabemos que se trata de um sistema de exploração econômica baseado no trabalho forçado e que isso acarreta em violências de diversos tipos. O genocídio da população nativa, a escravização de populações africanas e uma sociedade construída no estupro traz consequências graves pra sociedade brasileira hoje. Além disso, as então colônias só podiam realizar comércio com suas metrópoles.


Todos esses elementos tornaram as colônias fontes de riqueza e possibilitaram a acumulação primitiva de capital por parte das metrópoles que desfrutam das consequências desse processo até hoje. A população indígena segue sendo perseguida, a população negra é fadada à miséria e à violência do Estado e as mulheres têm de lidar com a misoginia institucional. A persistência dessas características aponta para qual foi o desfecho no momento das independências. Quem pagou indenizações? As ex-colônias as pagaram.


Após as independências, ex-metrópoles exigiram indenização financeira. Foi assim o caso brasileiro, foi assim o caso haitiano. Sob o risco que as nações recém nascidas corriam de não serem reconhecidas pelas grandes potências e serem fadadas ao isolamento, as indenizações foram pagas. O país caribenho só conseguiu terminar de pagar sua dívida com a França em 1947. Pode-se argumentar que esse tipo de análise é anacrônica, mas é sempre bom lembrar que a história se faz a luz de seu tempo. E se já houve um momento no qual a história era escrita para glorificar as potências e amenizar suas perversidades, o momento agora é outro.


Imperialismo, independência e as indenizações não pagas

Imperialism de Granger.

Com independências assustadoramente recentes, o imperialismo foi a continuação do movimento de dominação econômica iniciado com as colonizações. A expansão imperialista garantiu que os países no centro da economia internacional prosperassem as custas do trabalho e consumo de países periféricos, garantindo escoamento de sua produção assegurando o seu crescimento econômico.


A violência explícita e subestimada de países como Alemanha, Inglaterra, Bélgica e França para com as populações submetidas ao imperialismo leva o nosso bom senso a concluir que são esses os países que devem indenizações. Estão de acordo com essa premissa países como Burundi, Namíbia e Quênia que em movimentos estatais ou da sociedade civil fizeram suas demandas por reparação histórica. O ativista herero - povo bantu que foi vítima do imperialismo alemão - Israel Kaunatjike indica três pontos centrais para a conciliação: "Pedido de desculpas, reconhecimento e reparação".


Considerado o primeiro genocídio do século XX, pelo menos 80 mil pessoas dos povos herero e nama morreram. Foto: BBC/Arquivo Nacional da Namíbia.

A conclusão óbvia é a de que as etnias afetadas pela dominação europeia deveriam estar no centro dos debates. Entretanto, não é dessa forma que as raras negociações que chegam a ser estabelecidas se desenrolam. A Alemanha por exemplo se recusa a reconhecer que deve reparações pelo genocídio na Namíbia e destinou 800 milhões de euros para projetos de infraestrutura que não contemplam a região onde a população herero se concentra. A rica Alemanha segue ditando as regras do jogo e se recusando a dar autonomia ao país para que os afetados decidam como devem ser feitos os gastos para reparação.


Luz do nosso tempo


Uma visão maniqueísta da relação Norte-Sul não reflete a realidade, não podemos perder de vista a complexidade das trocas contidas aí. Contudo, é também verdade a hegemonia econômica do Norte e seus mecanismos de manutenção. É aí que reside o problema, uma vez que se trata de um entrave para o desenvolvimento socioeconômico das nações do Sul. Dessa forma, estarmos atentos a nossa história, a como os mecanismo de controle evoluíram e a como se expressam hoje é fundamental. A valorização do Sul Global passa também pela valorização do potencial econômico da região, que por muito tempo serviu de desfrute apenas para o Norte.

 

Para saber mais:


- Matéria What is owed Africa, de Lynsey Chutel para a Quartz Africa;




- Reportagem Europa reluta em indenizar a África pela colonização, de Gemma Parellada para o El País.

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