O Brasil é hoje, um dos países mais afetados pela pandemia da COVID-19. Somos o segundo país com mais casos no mundo — mais de 1 milhão — e o segundo com mais mortos — mais de 55 mil. O país teve cerca de três meses entre a doença ficar conhecida na China e chegar aqui. Com isso, a grande questão é, dava para ter feito algo para estar em uma situação melhor ou a tragédia era inevitável?
A maioria vem sofrendo grandes impactos com a pandemia, inclusive Estados desenvolvidos como os EUA, que lidera as estatísticas de contaminados e mortos. Entretanto, alguns países do mundo conseguiram debelar o surto antes que ele se espalhasse. São os casos de Coreia do Sul, Alemanha, Nova Zelândia, Islândia e alguns outros poucos. Estes países tem em comum o fato de pertencerem ao Norte Global, possuindo melhores condições de desenvolvimento e infraestrutura. Ao compararmos com o Brasil, fica então a dúvida se a diferença está nas condições estruturais, já existentes nestes países e que nós não temos, ou se isso não faz diferença.
Junto com estes países, um que é considerado do Sul Global também conseguiu controlar a pandemia, trata-se do Vietnã. Tendo 1.100 quilômetros de fronteira com a China, o epicentro da pandemia, o país registrou um pouco mais que 350 infectados apenas, sem nenhuma vítima fatal até o momento. As estimativas são que seja um dos únicos países a crescer economicamente ainda este ano. Onde está o segredo dos vietnamitas? Na seriedade com que levaram a ameaça da doença desde o início.
O Vietnã é um país pobre, com uma população de 95 milhões de habitantes, cidades extremamente densas e uma infraestrutura precária. Além disso, seu processo de descolonização foi recente e terrível, levando o país a mais de 30 anos de conflitos que culminou com uma guerra mundialmente conhecida contra os EUA. Tudo isso terminou em menos de 40 anos e traz consequências até os dias de hoje. Por todos esses motivos, o Vietnã não tinha meios de realizar testes massivos na população, que foi a principal arma dos países mais desenvolvidos para controlar a situação.
Dessa forma, utilizando-se de sua experiência prévia com a SARS, em 2003, o país aplicou uma estratégia de baixo custo, priorizando o isolamento dos doentes e a localização das pessoas com as quais os infectados entraram em contato diretamente ou indiretamente. O primeiro-ministro vietnamita, Nguyễn Xuân Phúc, chegou a chamar a operação de Ofensiva Geral, relembrando os momentos de guerra. Logo no início, reuniram um comitê de gestão de crise, com médicos e cientistas, para combater a nova doença. Tomaram medidas bem assertivas, como, fechar o país muito rapidamente, convocar médicos aposentados e aumentar sua capacidade de produção de insumos necessários. Porém, a principal arma foi a quarentena de forma rigorosa e o processo de rastreamento dos infectados e seus contatos.
O esforço do Vietnã evitou que o país sofresse com suas deficiências e permitiu que abrisse sua economia mais rapidamente, quando a situação já estava sob controle. O trabalho de rastreamento continua e às vezes é necessário fechar alguma localidade inteira por apenas um novo caso. Conseguiram tirar proveito da sua nova situação, se tornando um exemplo de solidariedade internacional, com a ajuda e venda de insumos para diversos países, inclusive o antigo rival, os EUA.
O Brasil poderia ter feito algo parecido? Por aqui já possuímos um sistema que ajudaria na coordenação geral de necessidades, que é o SUS. Ademais, já contamos com diversos agentes de saúdes especializados nesse tipo de combate e rastreamento, por conta de epidemias passadas no país, como a dengue. Vendo o exemplo vietnamita, temos a certeza de que se tivéssemos um Governo Federal que levasse a situação a sério e pudesse coordenar nossos esforços, poderíamos ter perdido muito menos vidas do que já perdemos e estar em uma situação mais controlada.
Para saber mais:
- Livro A Revolução Vietnamita: da Libertação Nacional ao Socialismo, de Paulo Fagundes Visentini, publicado pela Editora Unesp;
- Matéria Como o Vietnã conseguiu vencer o coronavírus, apesar do sistema de saúde precário, na BBC News Brasil.
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